quinta-feira, 28 de julho de 2011

O treino da morte


Não é fácil fazer isto se tornar realidade
  

 



-Oi Miriam, tudo bem? agradeço o convite para ficar na sua casa, mas tenho que estar às 6:00 hs da manhã na represa Bilings.
-Heih??????
 
Esse diálogo não é ficção! aconteceu de fato. Não lembro exatamente em que mês foi, mas quando soubemos que o Harry vinha para São Paulo, convidamos ele para ficar em casa. E olha só qual o programa que ele tinha!
Conversando com ele, perguntei mais sobre o tipo de treinamento que vai fazer. Foi quando me lembrou da conversa acima.
Aproveitando esse momento do blog, resolveu me contar sobre os tais "treinos da morte"!
" É o seguinte: existem treinos complicados, e que alguns técnicos chamam de treino da morte, não que eu tenha feito nenhum deles ainda, mas já passei perto.
 Agora treinando para o canal vão ter alguns e o próprio Igor me disse que de agora até a travessia terão duas semanas que ele chama de treino do inferno." 
Então ele exemplificou melhor:
São 3000 metros de natação, intercalando alguns tiros (nados rápidos cronometrados) ou muitos nados medley. Não parece lá muito fácil...
Completando o depoimento dele, dá pra entender porque esses treinos foram batizados assim:
"Nestas semanas do treino do inferno, sei que vão ter treinos que ele vai me acordar  às 3 da amanhã para nadar no mar, ou em  águas geladas da represa de Itatiba ou  de campos do jordão . Até o dia da travessia terei que nadar 12 horas seguidas. Serão assim, como diria... coisas assim ... meio malucas!"
Estou começando a achar que o Harry é mais doido do que eu pensava...
Em geral, no treino da morte são muitos metros nadados. Numa semana nada-se em média, 3500 metros por dia, em outros treinos, 4.500. Harry já está prevendo que nesses dias nem vai trabalhar, porque ficará umas 4 horas na água...
Ops! Será que essa informação era confidencial?

terça-feira, 26 de julho de 2011

E quem é o técnico especialista?




Igor de Souza, o técnico



Para um feito como esse, um treino específico é imprescindível.
Por essa razão, vamos conhecer o Igor de Souza.
O Igor na verdade, é um ex nadador de maratonas aquáticas e que também já atravessou o Canal da Mancha duas vezes.
Não sei se isso acontece hoje em dia, mas nos anos 90 quando ele atravessou, quem batia recorde ganhava um relógio Rolex. Ele ganhou dois, pois atravessou uma vez da Inglaterra até a França, batendo o recorde da travessia e um ano depois, fez ida e volta, batendo o recorde de ir e voltar.
Ele passou a treinar nadadores que competem em piscina e se especializou em preparar nadadores para travessias maiores como do Canal da Mancha, Estreito de Gibraltar entre outras.
Igor é da Confederação Brasileira de Natação e diretor de maratonas aquáticas além de fazer parte da Federação Aquática Paulista (FAP). Acabaram se conhecendo quando Harry começou a nadar maratonas aquáticas. Até hoje, ele organiza os eventos junto com a FAP . Quando se conheceram, o assunto era o desejo do Igor de realizar uma competição em Ilhabela. Dessa forma, por dois anos, etapas do campeonato paulista foram realizadas lá.
Como sempre é chamado para ser o organizador da parte aquática de alguns eventos, Harry acabou acompanhando de perto seu trabalho, participando das competições que ele organizava. Dessa convivência, nasceu um profundo respeito pelo Igor.
Em 2009, Harry soube que ele também treinava nadadores para atravessar o Canal da Mancha e pela primeira vez conversaram sobre isso. "Ao longo do tempo, percebi que nadadores normais estavam treinando com ele e não somente os fora de série. Foi nessa época que vendo ele treinar um nadador que nadava conosco, que comecei a pensar na travessia como algo possível."
E que pessoa é o Igor?
Sempre muito atencioso, mas sem esconder o lado calado e sério. Por isso, foi logo dizendo: "este é um projeto muito difícil e caro. Se for para encarar, arrume dinheiro e comprometa-se a treinar 12 meses comigo, seguindo todas as minhas instruições. Serei então seu técnico e seu "guia" (pessoa que acompanha de barco, estimulando e orientando o nadador). E é fundamental que eu veja em você determinação, disciplina e comprometimento."
Ouvindo um discurso como esse, um nadador tem que estar muito certo de que é isso que realmente quer antes de assumir o compromisso.
Harry já presenciou muitas broncas dele em seus nadadores (e já tomou as dele também!) e me confidenciou que aos 54 anos, se submeter à um técnico rígido e sisudo vai ser uma nova experiência!
Obviamente, que o "treino da morte" deve ter alguma coisa ligada a tudo isso.
Mas esse é assunto para o próximo post!

segunda-feira, 25 de julho de 2011

Ode aos técnicos


Pódio com a bandeira do clube A Hebraica


Conversando com o Harry sobre o plano de treinamento, me dei conta de que ele não chegou até aqui de uma hora para outra.
E pensei que ao longo dos seus anos de esportista e especificamente de nadador, deve ter tido o apoio de vários técnicos.
Foi então que ele me contou mais especificamente como se envolveu com a natação e quem foram os técnicos que passaram pela sua vida.
Aos 37 anos, sofrendo de bronquite e asma, um médico recomendou a natação com fins terapêuticos. Foi aí que o Harry começou a nadar na Hebraica, clube paulistano que era sócio. Nadando informalmente foi convidado pela técnica Adriana Silva, para integrar a equipe de Masters do clube.
E foi assim, que mesmo sem planejar, o nosso personagem começou a natação competitiva.
"A Adriana Silva, com certeza foi quem primeiro me orientou, ensinou e corrigiu meu nado, pois nunca havia treinado na minha vida, muito menos participado de competições." Por essa fala, notei que embora algumas coisas acontecem casualmente, alguém que conhecemos despretensiosamente pode mudar a nossa vida.
Se a Adriana Silva conseguiu fisgar o Harry para a equipe de Marters e mantê-lo nadando pela Hebraica por anos, pode-se dizer que Beth Padilha foi a primeira técnica dele em Ilhabela.
Quando se mudou para o litoral, começou a tomar gosto por nadar também no mar e a Beth Padilha, referência em natação em Ilhabela, assim como seu filho Popoto, começaram a treiná-lo.
Depois conheceu Mario Bello, lenda no litoral de São Paulo, um dos inventores da prova 14 Bis. Ele sempre trabalhou com recuperação de pessoas doentes ou com problemas físicos, no mar, usando a chamada Talassoterapia.
"Com Mario Bello, aprendi a nadar no mar, aprendi a ter respeito pelo mar e por incrível que pareça, ele me ensinou a não ter medo de abrir os olhos e olhar pro fundo do mar. É um mestre, até hoje uma referência em maratonas aquáticas. Está com 70 anos e vive em Santos. De vez em quando aparece por aqui e nadamos juntos. Mario nada até hoje e ainda temos muito a aprender com ele."
Na sequência treinou com Zize, uma professora de ed. física, que morou em Ilhabela e o treinou por um tempo.
Atualmente quem é responsável pelos seus treinos em Ilhabela é a Camila Miguez. Na verdade, sua técnica desde final de 2006. Até hoje está lá, todos os dias, determinando os treinos, faça frio, calor, sol ou chuva. Camila tem a total admiração do Harry, porque mesmo ele recebendo treinamento de outra pessoa para o projeto do Canal da Mancha, ela participa desse processo acompanhando e corrigindo cada etapa.
A parte mais tocante no depoimento do Harry, foi ele reconhecer que ela não só não se intimidou com a presença de um outro técnico, como também compreendeu a importância desse projeto em especial.
Na "ode aos técnicos", Harry fez questão de reforçar o estímulo especial que está recebendo da Camila, que liga para ele à noite, ou na manhã seguinte aos treinos mais pesados, só para saber se ele está bem.
Descobri que "treino mais pesado", é apenas um eufemismo para amenizar o que os nadadores costumam chamar de "treino da morte".
Taí, Harry. Acho que conseguimos contar um pouquinho de cada um desses profissionais que têm importância na sua vida como atleta e como pessoa e ainda que eles nem tenham consciência do que representam para você, devem entender este post como um sincero "muito obrigado".
Agora, essa história de "treino da morte".... acho que você vai ter que explicar melhor, hein?

Pódio com a bandeira de Ilhabela

quinta-feira, 21 de julho de 2011

Tentando entender como isso começou


Cenas da travessia 14 Bis

Justamente porque tento entender onde e como isso começou é que tenho que voltar um pouco no tempo.
Segundo Harry, a sua primeira loucura marítima foi em 2003. A prova se chama 14 Bis e compreende a travessia de Santos à Bertioga, no estado de São Paulo. São 24 km de natação que segundo dizem, podem se transformar em 30 ou 40, dependendo das marés.
Boa parte dos nadadores desistiu antes de completar a travessia. Antes de começar, conhecidos do Harry disseram à ele que, com o nível técnico que tinha, em 7 horas terminaria a prova.
Depois um tempo, os nadadores se distanciaram uns dos outros, pelas diferenças individuais de braçadas e ritmo e ele se viu um tanto sozinho. Na verdade, estava ele e seu relógio. De tempos em tempos, consultava o seu próprio tempo. E passaram as tais 7 horas sem que ele avistasse o final. Muito difícil controlar o stress com dados como este! Quanto tempo mais seria preciso para completar? Talvez nesse momento é que o grande teste acontece. Sabendo que o nadador é acompanhado todo o tempo por uma equipe de apoio, quanto desespero é necessário para simplesmente desistir? Quanta sanidade é necessária para dosar a energia ainda restante e continuar nadando?
Harry contou que num determinado momento avistou um canal, onde era o ponto de chegada. Viu gente acenando, bandeiras, muito barulho. Enfim, uma festa! Conforme foi se aproximando, percebeu mais claramente a realidade: uma marina abandonada, o tal funil da chegada nada mais era do que um grupo de poitas e as bandeiras só tremulavam porque ventava muito. E a festa de recepção? Praticamente não tinha uma alma viva!
Soube pelo barcos que estavam à sua volta, que daquele ponto até a chegada teria mais 1 km de braçadas.
Mas ele completou! Foi recebido pela tradicional equipe de bombeiros que aguarda os competidores com cobertores e caldo de galinha quente, numa tentativa de minimizar os "estragos" por uma perda tão intensa de calor corporal.
Digamos que esse seria o primeiro "porquê" do projeto Canal da Mancha. Esse relato só tem importância porque segundo Harry, com o perdão do trocadilho, foi um divisor de águas na sua auto-confiança. Finalizar a prova em 8 horas e 15 segundos e até mesmo receber um certificado, fez com que ele identificasse em si mesmo, força e determinação, que poderiam ser usadas nas mais diferentes situações que ele ainda pudesse vivenciar, ainda que fora do cenário esportivo.
O segundo "porquê" poderia ser o encontro com Percival Milani, que aos 45 anos atravessou o Canal da Mancha. Desse encontro nasceu a semente-base. Com treinamento adequado, sim é possível! E quanto mais ele ia se envolvendo com o assunto, mais pessoas normais (segundo ele) - que também fizeram a travessia - ia conhecendo. Num livro escrito pela nadadora Ana Mesquita (que também fez a travessia), leu uma frase que marcou: "pessoas que se expõe à desafios como subir o Everest ou atravessar o Canal da Mancha, não querem ser melhores nadadores, ou alpinistas e sim, melhores pessoas."
Pegando carona no pensamento de Ana Mesquita, Harry me disse que apesar de ter tido até mesmo surtos alucinógenos no final da travessia 14 Bis, depois daquela prova, se percebeu muito mais tranquilo e paciente.
Imaginar que aos 55 anos, encarando um desafio dessa grandeza, poderá despertar em outras pessoas motivação suficiente para tentar algo novo, chega a ser inspirador. A idade deixando de ser um fator limitador faz toda diferença.



Simples assim!

Post número zero: mas que blog é esse mesmo?



Meu nome é Miriam. A única relevância nessa informação é o fato de eu já me apresentar como humana e não como ghost writer. Esse blog vai falar de outra pessoa. Um amigo de longa data: Harry Finger.
Ele sempre gostou de esportes e de competições. Nos conhecemos numa quadra de badminton, o que já mostra que ele gosta inclusive de esportes exóticos.
Há menos de um ano atrás (por volta de outubro de 2010), o Harry veio com a novidade: vou atravessar o Canal da Mancha. A nado.
Poderia ser uma decisão momentânea, motivada por alguma história incrível que ele ouviu, ou ser mesmo um projeto concreto. O tempo foi passando e pude ver que era realmente um projeto concreto. De todas as provas de natação bizarras que ele já participou, essa seria a maior de todas. Em todos os sentidos.
Entendi o tamanho do projeto quando ele contou que veio à São Paulo, procurar o técnico e delienar o treinamento.
No mínimo teria que fazer algumas adaptações nos treinos que já faz, na cidade de Ilhabela, onde mora. Só a diferença da temperatura da água, já faria com que esse treinamento fosse específico - águas tropicais x águas europeias. Sem falar na distância e com isso, duração da prova.
Vendo todo esse movimento, me peguei várias vezes pensando no que leva uma pessoa a desejar um projeto como esse. Entendo que seja desafio, determinação, ou até mesmo teimosia. Mas sempre penso na seguinte questão: pessoas são determinadas sempre, no varejo do dia a dia, ou precisam de algo grandioso e aos meus olhos, quase absurdo (nosso personagem terá, no momento da prova, 55 anos), para reconhecerem a sua própria determinação?
E essa dúvida ficou na minha cabeça alguns dias seguidos, até porque me perguntei se eu mesma teria algum projeto dessa grandeza que me desafiava. Por hora, meus desafios são outros. Não diria menores, porque desafio só é desafio quando faz alguma mudança significativa dentro de você. Mas definitivamente não atravessaria o Canal da Mancha nadando!
Resolvi abrir esse meu pensamento para o Harry: então, cara, o que é que passou e ainda passa pela sua cabeça? Desde que você resolveu levar isso adiante, o que aconteceu?
Acho que tanto para mim, como para ele, essa travessa travessia, pode trazer algo modificador. Quero pegar carona nessa loucura do Harry e entender melhor todo o processo.
Ainda estamos formatando como será a troca de informações, mas a proposta é relatar as etapas do treinamento e suas peculiariades.
Se tudo que ele experimentar for relatado num blog, não só eu e ele, mas muitas outras pessoas poderão acompanhar toda essa aventura, que deverá se realizar em julho de 2012. Teremos um ano de muitas braçadas, com certeza!
Combinamos que agora, o Harry vai alternar a contagem dos azulejos da piscina, com pensamentos curiosos que serão relatados aqui.
Como se não fosse esforço suficiente atravessar a nado o Canal da Mancha, nosso personagem vai ter que me abastecer com muitas histórias.
Afinal, Harry, escrever o seu blog será o meu desafio!